quarta-feira, 11 de setembro de 2019

TEx 2019: Contraste. As filosofias em Rei Leão.



Depois de longos vinte e cinco anos, uma das obras primas da Walt Disney foi remasterizada e passada nas telonas; a famosa animação cinematográfica “O Rei Leão”. Quando gostamos de uma obra é possível aumentarmos o seu nível de influência em nossos argumentos, mas declaro que aqui não será necessário este tipo de tratamento, pois a trama fala por si própria, do começo ao fim, bastando apenas observarmos de maneira pouco mais reflexiva.

Porém, mesmo apenas assistindo de maneira técnica, muitos já fizeram seus comentários, análises e críticas do filme, logo reduzem o seu conteúdo. Nós mesmos já fizemos isto, não é mesmo? E como é redundante repetir o que já foi exposto. Então, o papel que cabe a seguir é o da diminuição de conclusões rasas ao enredo infanto-juvenil, e sim um mergulho aos fundamentos filosóficos que carregam a narrativa e a tensão entre as cantadas trilhas sonoras.

Antes de focar nos chamados “Ciclo da Vida” e “Hakuna Matata” relembramos o contexto. Estamos na savana africana e todos os personagens são animais por natureza, os principais: Mufasa, o rei; Sarabi sua ‘esposa’; Simba, o filho do casal e Scar, o irmão do rei. Todos Leões. Aqui existe uma regência que organiza toda a forma existente, e a totalidade reconhece isso, logo no início, quando todas as espécies se curvam ao olharem Simba, mesmo ainda jovem, sendo erguido pelo macaco Rafiki (tipo um sacerdote numa cerimônia religiosa). Sarcasmo é conotado na perspectiva do Timão e Pumba a olhar para a cena, estes toleram o acontecimento, e mais, em seguida contrapõe o regime normativo das terras reais, sempre ignorando. As cenas iniciais terminam com o pássaro Zazu (conselheiro real) cobrando Scar por não aparecer a apresentação do sobrinho; ele pouco caso faz, e apresenta suas características em oposição ao reino, pois se envolve as escuras com Shenzi e as hienas; conspirando o tempo todo.

Decorremos aos ensinos do rei ao seu sucessor, e a primeira é entender que o sistema monárquico não é feitura para abuso, e sim para cuidado de todos e todo território marcado. Mas o que mais Simba quer é ser rei, e ele não está afim de aprender tudo possível; Nala, sua ‘amiga’ é negada ao matrimônio em tom de brincadeira, e rir na cara do perigo virá um jargão. Então, Mufasa vai ao cemitério para gerar vida, e mostra que ser valente não opõe o medo.  Aliás, a força de lutar não deve ser a todo momento, mas apenas quando necessário. O temor e o tremor devem acompanhar o ser vivente, pois quando o perde começa a abraçar as tolices, de procurar atos de heroísmo, e demonstração patética a comunidade, quando ela já o conhece.

Ouvi dizer que as passagens bíblicas de Moisés e até José são relembradas depois do fator que cisma o filme em dois, até uma das obras de William Shakespeare e a bela história de Mandela possuem elementos após a morte precoce do rei e a armação ‘teatral’ de Scar, que o levou ao trono. A tragédia inesperada no desfiladeiro tirou qualquer olhar simplório à obra, é drama. Pois é justamente aqui que começa, no fim, na desconstrução, no caos é que procuramos por alinhamento, pelo cosmos, pela lei e pela ordem. O mancebo Leão resolve ouvir o seu familiar de raça, mas inimigo de alma, pois é o que acusa e aponta no momento de aflição. Encena mais uma vez: “A culpa é sua”, “Você matou seu pai” e “Então, fuja, e nunca mais volte”.

As frases são muito fortes, e a cena do filho procurando reanimar o Pai também; passamos para outro contexto, inversão, mais que a sobrevivência, a procura pela identidade do exilado. Scar tornou-se rei, as hienas malquistas, aliadas; a alienação numa realidade que não devia acontecer virá a base cultural no habitat natural dos bons, que agora é liderada pelos maus.

O leão órfão até aqui tinha apenas conhecido um estilo de vida, o do seu Pai, algo que é sem fim e eterno, o chamado “Ciclo da Vida”. Mas, o que seria exatamente esta ideia? Pensamos. O Ciclo remonta uma cadeia circular onde todos somos afetados e afetamos alguém de maneira direta ou indireta, mostra total importância as ações feitas aqui; como um quebra-cabeça gigante onde tudo se encaixa, e possui sentido e significado. Quando se trata da vida, mesmo com suas diferenças, há uma relevância única em cada ser, sendo necessário descobrir, pois cada um se encaixa nesse Ciclo da vida, não há maior ou menor, mas seres que são uma unidade coletiva, que vivem sabendo seu lugar, e quem nasceu para ser, não precisando mudar sua identidade, assim vivendo até a sua morte, que através do legado não terá um fim.

No conflito e silêncio ao coração, a abertura para o grito: “Hakuna Matata” do suricato e do javali mais querido da televisão, tão bem que esquecer e/ ou não há problemas torna O lema. Timão e Pumba apresentam uma linha, o contraste ao modo até então construído no filme, ela é bem mais profunda do que uma canção, pois torna a dormir até o leão. Em geral, esta linha busca felicidade na tranquilidade (Ataraxia) e por conta própria; diverge das coisas ruins que acontecem, e concorda que não é possível mudar o que ocorreu, encarando a vida como alguém que se deita e prostra em meio ao discurso do destino imutável. “Nada se pode fazer”.

Timão possui uma história de fuga a sua realidade de cavar buracos e esconder de predadores, e parte na busca do além; em peregrinação encontra Pumba, que tem um histórico de rejeição. Os dois decidem caminhar juntos, e quando encontram o desejado vivem como epicuristas. Neles aprendemos a importância da amizade, dos grandes valores da vida, mas apenas. Está abraça o leãozinho, que bem rápido se abre a novos conceitos; ainda é jovem, e a fuga aparenta ser benção. Logo os paradoxos no paraíso começam, tipo: Um leão vegetariano?

O romper de toda esta aparente beleza se dá no aparecimento de Nala, e na noite onde “O amor chegou para ficar”. A esperança ao encontrar o legítimo rei faz o ‘improvável’ casal a se apaixonar; mas ainda não tirou Simba das regalias. A fé, firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das que não se veem (Hebreus 11.1) se mostra nos questionamentos de Rafiki, este colocou o leão já adulto nas suas aflições, o que irá guiá-lo? Grande questão! Esquecer ou abraçar imobiliza as nossas reações, e em geral é como mais ficamos, provei e vi.   Mas foi ao ouvir a voz do Pai, e observar o Leão dentro que tornou Simba a tornar quem ele de fato é (Nietzsche), e não quem escolheu ser. Entende a diferença? Ele abraçou isto, e foi logo requerer o trono que era dele por direito. Antes de ir à luta influencia quem por tanto tempo o influenciou, e observa todo cenário horrendo que a sua casa tinha se tornado, escura trevas.   

O enfrentamento como em qualquer épico seria necessário para o grande final; já o sacramento é com um forte rugir, inevitável. Isto ocorre depois das mentiras e farsas do fake king caírem por terra. Apesar da verdadeira ordem ser dada pela vitória simbólica de Mufasa em meio a Simba, a vingança não vira temática, pois a morte de Scar foi justamente pelas suas ‘amigas’ hienas. Em meio a chuva, trovões e fogo houve a mesma possibilidade, a de fuga. Porém, como no fim de qualquer tragédia, as escolhas se findam, pois, deve haver resoluções; e aqui não foi de ganho de alguns poucos, pois brilho e cicatriz em breve dariam as mãos, a glória foi de um todo, que vive/aprende em lembrar (memória) mesmo em dor física e mental.

Observação: O filme em nenhum momento se posiciona de maneira ideológica as políticas partidárias da atualidade (nem tudo se resume a isso amigos), porém ele apresenta modos de como caminhar em nossa jornada, com interesse em não ignorar a espiritualidade. Aliás, na voz de Beyoncé alguém nos chama, para tornarmos algo através do único que é. (Êxodo 3.14)

 Por: Jefferson de Melo


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