domingo, 8 de novembro de 2020

T11 20 – Nem Apolítico, nem politizado.

Nem sempre negar é uma boa maneira de começar. O conceito negativo em nossos dias, tem se tornado fonte de escândalo em diversas esferas, como se fosse uma ideia que precisasse urgentemente ser erradicada. Em oposição, o positivo deveria ser sempre auto-afirmado. Assim fazemos, ciclicamente, com nós mesmos em primeira instância; nunca podendo ser exortados; nem com as palavras, muito menos em nossas ações.

Parece que o negue-se a si mesmo, condição necessária para um seguidor de Jesus, é uma ideia ultrapassada, não cabendo como lição a atual sociedade, menos ainda, as novas crenças.

Possivelmente, o termo mais ouvido pelas crianças em seu desenvolvimento é o “não”; este ensinou na dor; lacrimejou, e querendo você ou “não”, nos gerou. Mais que isso, na sua longa jornada formou, e forma, milhares de cidadãos ao redor do mundo. Somente valorizando as negativas é que podemos compreender o que queremos falar quando dizemos os conceitos, apolítico e politizado. 

Etimologicamente, na palavra “apolítico”, /a/ está no sentido de oposição ou negação, e político (πολιτικός); transliterado [politikós] é retratado em Aristóteles como a ciência que tem por objetivo a felicidade humana e divide-se em ética (que se preocupa com a felicidade individual do homem na Cidade-Estado, ou pólis), e na política propriamente dita (que se preocupa com a felicidade coletiva).

Genérico a isso, a palavra “politizado” retrata o indivíduo que foi alvo de politização, que passou a adquirir um caráter político; que se educou politicamente. De modo direto, e sem olhar as nuances, ele é a semente daqueles que compreenderam o fundamento que o discípulo de Platão postulou a cima.

Com os termos definidos, podemos esclarecer a necessidade de negação de um, quanto a do outro. Ainda mais em tempos alarmantes como os de eleições; onde as palavras caem ao vento, é preciso razoabilidade. O primeiro passo a isso é visto na literatura, em uma indagação da personagem Alice, em não saber para onde ir. Veja a resposta.  

Diz o Gato Cheshire: “Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve”.

Não devemos rejeitar a política! E já que negar a negação em lógica é afirmar, devemos assim o fazer, diante de nossas cidades e estados. Mesmo quando a Alice da história somos nós, ser apolíticos deve ser a última instância do nosso ser, e digo isso de forma literal; já que não pensar em nosso bem, e no bem comum é a morte. Alguns dizem que é impossível ser apolítico em algum sentido; porém, já diria o poeta contemporâneo, o impossível é só questão de opinião.

Ainda, para melhor entendimento, é possível dizer que existem dois tipos de apolíticos, chamaremos a seguir de alfa e beta para distingui-los.

O apolítico alfa é muitas vezes ignorante ao mundo sistêmico e as camadas sociais que o cerca; e por tais fatores se distancia dele. Sua simplicidade e sinceridade é pouco compreendida nesse mundo maquiavélico, então, perdido, sem saber para onde ir, caminha em meio às massas. Aceita abertamente a resposta do Gato Cheshire, pois não entende as perguntas do jogo. Mesmo assim, ignora os assuntos públicos, como se eles não existissem, sendo um grande prejuízo a todos. 

Entretanto, temos um apolítico beta, que pode nascer do que chamamos de “politizado”. Este, por meio de diversos veículos, começa a acreditar em outros tantos conjuntos de filosofias, já que desacredita, inicialmente, da democracia. Então, ele caminha, geralmente, para as tiranias, monarquias, em anarquia; fundadas em perda total de sentido, desequilíbrio, niilismo e facetas de totalitarismo. Estes são conhecedores de muitas coisas; neles não se condiz os muitos caminhos e a dúvida. O segundo passo a razoabilidade é vista na sentença de Arquimedes.

“Dê-me uma alavanca suficientemente longa e um lugar de apoio, e eu moverei o mundo”.

A frase descreve as possibilidades, que apenas um instrumento e um ponto de fixação pode causar, isto na matemática, isto em qualquer lugar. Se negamos uma sociedade apolítica alfa; desprovida de vontade a participação decisórias de sua realidade; também negamos os “politizados”, e os apolíticos beta, que trabalham no meio do povo, mas não são o povo. Estes, especificamente, são aqueles que não procuram a felicidade humana; nem a sua, e nem a da coletividade. Os tais, na verdade, fragmentam o todo. Sim, e a partir de suas perspectivas, geralmente em contradição ao estabelecido, criam diversos monólogos, deturpam a verdade, geram pós-verdades e destroem aos poucos a beleza do diálogo.

Penso que a politização já é um olhar de interpretação, logo partidário. Seu engajamento não busca uma mentalidade "livre", mas já estabiliza alguma secção. Então, o apolítico alfa no texto, é o que se opõe a política, seja ela qual for, pois, o mesmo nem precisa ter ciência que está rejeitando a mesma, mas o apolítico beta difere. Este, acredita em uma forma de "política" em politização; ele busca por vezes fugir das mesmas bases que o fundamentam.


Os apolíticos (alfa e beta) não ajudaram na construção de uma sociedade livre, justa e solidária como está descrito na Carta Constitucional de 1988, em nosso 3° artigo. Porém, os “politizados”, às vezes chamados de revolucionários, aos poucos, deturparam todos os alicerces de nossa edificação.

Mas, Lago disse: “Democracia não significa tirania da maioria”. E é por isso que devemos observar as nuances, sem se retirar do debate, entendendo o como podemos servir a nossa nação de modo sensato. Toda ela, a partir de todo o povo.

“O poder não vem de igrejas evangélicas nem outras instituições religiosas, de corporações midiáticas, de partidos políticos ou de empresas privadas – somente do povo”. (LAGO, 2018, p. 174, grifo nosso)

Sendo assim, precisamos razoavelmente de mais diálogos, para que mais pessoas se tornem políticas. Este seria o termo correto, já que ela tem sua gene no coração e na consciência. Logo, o ser político não é apolítico e nem politizado; ele na verdade é um cidadão engajado a compreender os fatos, antes de inferir sua cosmovisão a eles próprios. Pois, colocar quaisquer óculos sem abrir os olhos a priori, não adiantará de nada.

O mesmo foge das militâncias, pois se preocupa com o todo, e não com as múltiplas minorias. Que pelo menos este aspecto de cidadania, vinda dos gregos, retorne a nós. Esta era a sua liberdade, participar, se envolver. Os modernos, inverteram o senso de livre, quanto ao diminuir o estado, fixou o desejo de uma vida mais privada, invés de pública.

Esta reviravolta nos influenciou, e criou uma tensão, onde sua resolução se origina apenas por meio de muita reflexão. Então devemos seguir a indagar, trabalhar e daí sim votar; para que possamos avançar, juntos. Observe este pensamento de Stefan Paas.

“... cristãos devotos e ateus comprometidos são geralmente minorias, enquanto a grande maioria da população se considera um tanto espiritual (em diferentes graus), desde que isso não inclua a submissão à autoridade de uma instituição”. (DULCI, 2018, p.22, grifo nosso)

E essa junção citada acima é dos diferentes, até mesmo em suas crenças. Não somos um estado cético, mas também não somos um estado cristão, então, no que se assemelhamos? No fato de sermos brasileiros, filhos deste mesmo solo, e isso deveria anteceder qualquer conclusão candidato a candidato, respostas prontas e análises superficiais, pois, antes de tudo precisamos de uma emancipação coletiva; de um povo, todo. Para que o cidadão, em nossa sociedade, expresse política.

 

   Referências:

1.    https://www.bibliaonline.com.br/acf/lc/9/23

2.    https://www.dict.com/grego-portugues/

3.    https://brasilescola.uol.com.br/politica/politica-definicao.htm

4.    https://www.dicio.com.br/politizado/

5.    https://www.filosofiaesoterica.com/alavanca-mover-mundo/

6.    Música: Só os loucos sabem por Charlie Brown Jr.

7.    Constituição Federal de 1988.

8.    CARROLL, Lewis. Alice no país das maravilhas.

9.    LAGO, Davi. Brasil Polifônico.

10.  DULCI, Pedro. Fé Cristã e Ação política.


Por: Jefferson de Melo